[Piloto] Xandão dá sinais de linha dura contra a desinformação nas eleições
Olá! Esta é a primeira edição da DERT (aceito sugestões de nomes). Minha ideia é trazer debates sobre o universo do combate à desinformação nas redes sociais pelo menos uma vez por semana, mas admito que posso falhar nos prazos. A estreia expõe um pouco da repercussão da decisão de Moraes em proibir associações entre o PT e o assassinato de Celso Daniel. Também escrevo sobre a decisão do YouTube em manter a live de Jair Bolsonaro com os embaixadores e outras coisas mais. Boa Leitura!
Xandão dá sinais
A semana começou agitada com a determinação do ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre Moraes de proibir a publicação de conteúdos que associam o PT à morte de Celso Daniel, ex-prefeito de Santo André assassinado em 2002. O magistrado acatou uma ação do partido que pedia a exclusão de postagens feitas por políticos bolsonaristas, como Carla Zambelli, Otoni de Paula e Flávio Bolsonaro.
Ao sustentar sua decisão, Moraes argumentou que os conteúdos fazem associações sem provas, apenas citando trechos de uma delação premiada em sigilo, que, segundo ele, não constitui prova. É difícil mensurar qual o impacto do episódio sobre a disseminação dessa narrativa nas redes sociais, mas a repercussão foi explorada por apoiadores do presidente para alimentar a tese conspiratória de que o judiciário age para eleger o ex-presidente Lula, em detrimento de Jair Bolsonaro.
A associação entre o PT e o caso Celso Daniel ganhou tração nas redes sociais a partir da publicação de uma matéria da Veja, em 1 de junho, com trechos inéditos da delação premiada do empresário Marcos Valério, que está em sigilo. A narrativa ainda explora outras notícias, como a investigação que aponta uma suposta ligação entre um contador que trabalhou com Lula e o crime organizado.
Em referência ao ato do ministro, uma postagem do canal bolsonarista Netinho Oficial Brasileiro no Telegram questiona “Por que o TSE está protegendo o PT?”. Já Eduardo Bolsonaro e outras personalidades bolsonaristas bateram na tecla da censura. O filho do presidente classificou a decisão do ministro como “injustiça” e convocou voluntários a “equilibrarem esta eleição”.
Apesar disso, dados de interações no Crowdtangle indicam que, ao menos no Facebook, o número de conteúdos que citam o termo “Celso Daniel” foi menor após a decisão de Moraes do que nos dias seguintes à publicação da matéria da Veja. Em primeiro de julho e 5 de julho, o termo alcançou 562 mil e 444 mil interações, respectivamente. No dia 18, data da decisão de Moraes, foram 192 mil menções. Essa análise, porém, não permite separar quais conteúdos só citavam a matéria da Veja e quais faziam uma associação insinuosa do assassinato de Celso Daniel com o PT.
Na imprensa, análises apontam que o episódio mostra como será a atuação do magistrado nas eleições de 2022. Texto do jornalista Felipe Recondo no Jota prevê que o Moraes será sempre rigoroso e rápido ao analisar processos sobre desinformação nas eleições. “O que se espera, portanto, são decisões em grande número para determinar a retirada de conteúdos apontados como falsos e a responsabilização dos envolvidos.”, escreve Recondo. (JOTA)
YouTube deixa mentiras de Bolsonaro no ar
O YouTube decidiu manter em sua plataforma a transmissão ao vivo do evento promovido por Jair Bolsonaro com embaixadores no qual o presidente espalhou uma série de informações enganosas para descredibilizar o sistema eleitoral brasileiro (Estadão). Ele repetiu boatos já extensivamente desmentidos pelo tribunal e agências de checagem de fatos, por exemplo, que as urnas eletrônicas autocompletavam votos e que o TSE teria admitido que o ataque hacker à corte em 2018 poderia resultar na alteração dos resultados eleitorais. (Estadão Verifica e Aos Fatos)
Ao justificar sua decisão, o YouTube disse ter ouvido “especialistas externos, criadores de conteúdo e a sociedade civil” e que busca garantir um equilíbrio entre liberdade de expressão e a segurança dos usuários. Por outro lado, a empresa removeu um vídeo de 2021 no qual Bolsonaro também fazia alegações infundadas de fraude nas eleições 2014 e 2018, entre elas de que o ataque hacker teria comprometido a última disputa eleitoral.
Neste caso, porém, a companhia alegou que remove afirmações falsas de que as urnas eletrônicas foram hackeadas ou de que os votos foram adulterados. (CNN Brasil)
O posicionamento do YouTube não deixa claro quais critérios que diferenciam o tratamento da plataforma para os dois vídeos. O episódio reforça que as gigantes de tecnologia precisam ser mais claras e transparentes ao justificar a remoção ou não remoção de um vídeo desinformativo. Não basta se apoiar em diretrizes da comunidade, que muitas vezes são vagas e generalistas. Vale lembrar ainda que o YouTube já removeu quatro conteúdos em que o presidente espalhava mentiras danosas sobre a covid-19. (Poder 360)
Desinformação mira votos nulos e abstenções
Uma análise do Aos Fatos identificou que uma a cada três mensagens sobre voto nulo e abstenção em canais de WhatsApp monitorados pelo veículo são falsas ou enganosas. É interessante a constatação de que alguns conteúdos citam as eleições mais recentes no Chile e na Colômbia. Os dois países elegeram candidatos de esquerda e historicamente possuem taxas de abstenção maiores do que o Brasil provavelmente porque o voto não é obrigatório. (Radar Aos Fatos)
Considerando que uma pesquisa recente aponta um crescimento do desinteresse do braisleiro pelo voto (Yahoo), a taxa de abstenção pode estar na mira dos desinformadores no cenário pós-eleitoral de 2022, quando independemente do resultado, agências de checagem e plataformas terão um trabalho árduo para combater narrativas falsas sobre as eleições.
Outras histórias interessantes
Jovens britânicos se informam pelo Instagram. Uma pesquisa britânica identificou que, no Reino Unido, as principais fontes de notícias de jovens entre 12 e 15 anos são o Instagram, TikTok e YouTube. Chama atenção que o WhatsApp ficou bem atrás, perdendo inclusive para veículos de imprensa. (Variety)
Leis municipais ultrapassadas podem empatar o 5G no Brasil. Na semana passada, começou a operar em Brasília o primeiro sinal 5G do país. Uma análise de Paulo Silvestre no Estadão aponta que a tecnologia pode esbarrar em entraves regulatórios municipais acerca de antenas e infraestrutura necessárias para que a rede móvel avance no Brasil. (Estadão)
Projetos de combate à desinformação interessantes. O IJNET, em parceria com o YouTube, vai financiar e capacitar seis projetos de combate à desinformação no Brasil. As iniciativas escolhidas foram divulgadas na semana passada. Entre elas destaco o projeto do Aos Fatos que desenvolve uma ferramenta de transcrição de vídeos pública e gratuita para jornalistas e pesquisadores. O melhor de tudo é que a iniciativa ainda prevê um arquivo público com o conteúdo transcrito. Também vale a pena conhecer as outras iniciativas (Centro Internacional para Jornalistas).